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- Não era pra você me ver assim!
- Claro que era, vim cuidar de você, fazer um chazinho...
- Só mãe pode tá perto de alguém deformado pela gripe... nenhum outro amor resiste às olheiras, coriza, catarro... ai, me passa um lenço, por favor?
- Aí que você se engana. E pra te provar...
- Não!
- Como “não?” Ó, funciona assim: eu abro a caixinha e você diz “sim”. Quer tentar de novo?
- Não é isso, é que eu sempre imaginei que nesse momento eu estaria fabulosa num restaurante francês, reclamando do vinho e pedindo sobremesa extra, não prostrada numa cama com o nariz escorrendo! Passa o lenço, vai, amor...
- Esse é o momento perfeito. Fica valendo todo aquele negócio de estar presente na saúde e na doença. Amor, você tá com um olho maior que o outro, seu bafo não tá dos melhores e ainda assim, quero casar com você.
- Meu Deus! Não sei se é a febre, mas assim você me faz chorar.
- Isso é um sim?
- Você tem alguma dúvida?
- Na verdade tenho... onde eu boto essa aliança? Mão direita ou esquerda?
- Esquerda, né? Lado do coração?
- Coração não fica à esquerda. Na verdade fica bem ao centro.
- Nunca soube disso.
- Sério. Dá um Google.
- Puxa o note aí. Aproveita e pesquisa em que mão se bota aliança de noivado. Ai, caralho, a gente tá noivando?
- É assim que funciona. Assim que eu descobrir que mão que é, num tem mais volta.
- A gente não pode dar outro nome pra isso? “Noivar” é muito brega. “Meu n-o-i-v-o”. Meio esquisito. Você quer ser chamado de noivo?
- Acho que não. Prefiro “patrão”.
- E se a gente “sibilar”?
- Sibilar?
- É, a palavra que eu inventei pra substituir “noivar”.
- Querida, acho que essa palavra já existe...
- Não, eu acabei de inventar.
- Não inventou não, acho que signifi...
- …aah, vai! Vamos sibilar, por favor! Somos agora sibilantes!
- Ok. Sibilemos. E com a benção do Google, mão direita, por favor.
- Não é a esquerda?
- Ainda não. Enquanto sibilantes, aliança na mão direita.
- Num dá pra pôr na esquerda só por hoje? Você demorou com o lenço, eu acabei usando a mão direita, e agor...
- Tudo bem. Mão esquerda. Isso quer dizer que a gente pulou o “síbilo” e casamos direto.
- Que outro verbo podemos usar no lugar de “casar”, hein?
Um dia eu sei que os meus esforços em fazer a gente pegar um elevador juntos vão valer a pena. E aí eu vou puxar assunto, dizendo que seria incrível se o teletransporte fosse possível e assim que a porta do elevador abrisse, eu já estivesse na minha casa. Aí você, curioso, vai perguntar onde eu moro e, penalizado pela distância, manifestando cavalheirismo e ocultando segundas intenções, vai me oferecer uma carona. Eu vou mentir ao dizer que não estou de carro e portanto aceitarei, exibindo falsa timidez diante da oferta. No dia seguinte, pagarei uma fortuna no estacionamento onde abandonei meu carro e fingirei não compreender o ressentimento do manobrista desavisado que esticara em 12 minutos o expediente por minha culpa.
Essa será sua primeira chance de perguntar o meu nome. Friamente dissimulada, finjirei não saber o seu e devolverei a pergunta. No fim da noite, escreverei num guardanapo o meu telefone com a mensagem “se você tiver um tempo livre, gaste comigo”. Você vai perguntar o porquê das aspas, e eu explicarei que é um trecho de uma música que não é da minha autoria. Você vai suspirar, dizendo estar aliviado por eu saber empregar aspas, ao invés de usá-las deliberadamente, como na famosa placa: Jesus “loves” you. Eu vou rir, você vai rir, a gente vai lembrar das nossas web celebrities favoritas, eu vou descobrir seu talento em imitar “Vanessão” e “Jeremias”.
Em poucos dias, decidiremos fazer uma viagem juntos. Eu escolherei uma linda casa aconchegante numa cidade miseravelmente feia, em que a previsão do tempo seja de muita, muita chuva. Por um fim de semana inteiro teremos apenas um ao outro para distrair com muita obscenidade e comida calórica.
Você vai falar mal da Tina Fey e eu vou ficar horrorizada. Serão os dois minutos mais tensos de todo o tempo que passamos juntos e eu falarei mal de House em retaliação. Você vai rir do meu espírito vingativo e me achar super charmosinha fazendo bico. Vai me chamar à atenção sempre que eu entortar os lábios, esse hábito involuntário de quando estou preocupada. Vai exibir provas fotográficas do quanto eu fico feia quando mordo os lábios assim. Vai ameaçar montar uma exposição com todas as minhas expressões distorcidas. Eu vou ficar furiosa, apesar de perceber qualidade na obra que você reuniu ali.
Você vai morrer de ciúmes do mais másculo dos meus amigos gays e eu vou tentar dissuadi-lo contando a história de quando o tal amigo me pediu em casamento só para herdar minhas roupas. Em seguida, terei um dos meus chiliques. Você vai ficar assustado com meu temperamento, vai ameaçar me deixar, e no fim da nossa cena mexicana, vai confessar que nunca gostaria de uma garota que não fosse tão tempestuosa quanto eu. Eu direi que sempre soube que homem gosta de mulheres equilibradas, mas não se apaixona por nenhuma delas.
É assim que vai ser e já tá decidido. Tudo o que você tem que fazer agora é dizer “oi”.
- Eu quero muito você.
- Eu também.
- Vamo resolver isso. Vou te levar pra casa.
- Minha casa é longe, você vai se perder na volta...
- Pra minha casa, eu quis dizer.
- Ah... não... não posso, não posso.
- Por que não?
- Oras, porque eu gosto de você.
- E o que eu posso fazer pra você me odiar?
- Engraçadinho...
- Vem comigo então...
- Não posso, se eu for, vou acabar dando pra você...
- Isso me soou como um incentivo.
- ...e se eu for e der pra você e você nunca me ligar, eu vou achar que eu sou uma idiota. Se tudo terminar por aqui, e você nunca me ligar, pelo menos eu vou achar que você é um idiota.
- Ou, ao invés da gente se separar aqui, você podia ir lá pra casa.
- Pra sua casa?
- É. A gente podia ir pra lá, assistir o canal de leilão de gado, comer pipoca, tomar vinho, aprender código Morse...
- Em que situação seria útil saber código Morse? - Ri.
- No caso de estarmos no cinema e eu quiser comentar com você que é uma péssima idéia fazer um playback da Penélope Cruz cantando, sem atrapalhar os outros na sala. Toques longos e curtos na sua mão que não vão ser seguidos de um sonoro "shhhhh!".
- Tá, eu gosto da idéia. Gosto de você também.
- Sabe que inventaram uma convenção chamada "namoro" pra oficializar esse sentimento mútuo?
- Você acha que a gente devia tentar? Embora tenha virado modinha?
- Depois que a gente entrou na modinha sem graça de 3 refeições diárias e exercícios físicos regulares, acho que a gente não tem nada a perder.
- Então fecha o olho. A gente começa a namorar em 5, 4, 3, 2...
Achei que devia avisar que eu gosto mesmo de você. Não com romantismo e reais expectativas de que seja um sentimento mútuo. Apenas pra constar. Que nos arquivos da sua memória, haja um anexo na minha ficha que declare, alerte, informe que trata-se de uma pessoa potencialmente atraída por você. Uma informação que ative um alerta cognitivo de "watch out", que seja emitido sempre que você tiver as idéias que geralmente tem. Como o de explicar qual lado do meu cérebro está ativado quando eu ouço Nina Simone. Explicar a etimologia da palavra "suspiro". Fazer um interurbano pra cantar a versão forró traduzida de "Nothing Compares" da Sinead O'Connor. Escrever e-mails com o emprego correto do ponto e vírgula. As suas tentativas de fazer meu cabelo ficar bonito e não se importar que eu diga que isso é muito bicha da sua parte. De me abraçar por mais de 8 segundos e saber exatamente qual perfume eu tô usando. De repetir o fim das minhas frases imitando o Barbosa, só pra me fazer rir. De não se importar que eu sempre durma na metade dos filmes que você escolhe e ainda me premiar com um cafuné. Entenda, é importante que você registre isso, porque é por essas e outras pequenas bobagens que eu acabo quase acreditando que você sente o mesmo. Seu cretino.
Depois das 6 primeiras agonizantes horas do dia, tomada pela ansiedade e pelas previsões de um futuro enganador, decidiu fazer justiça com as próprias mãos e partir para atitudes drásticas. Pegou o telefone, buscou confiante o número dele na agenda e disse, assim que ouviu sua voz: "só estou ligando pra você no dia seguinte pra que você não se sinta um pedaço de carne usado por mim. Você tem brilho, importância e não é só um rostinho bonito. Obrigada."
Com você eu quero
assistir TV Senado
passar lua-de-mel na Praia Grande
Ter dois filhos
um cujo nome seja a mistura do meu e do seu
outro cujo nome seja a mistura do seu e do meu
tirar fotos no zoológico com a família
espremer suas espinhas em público
e fazer pizza de arroz e feijão
brindar nosso amor com rabo de galo
criar uma comunidade no orkut
"eu amo esse casal"
Dois apelidos constrangedores
e um adesivo no nosso carro com meu nome
A gente vai ganhar peso junto
e rir com Zorra Total
Esse é o tanto que eu quero estar com você
Um tanto, tanto, tanto
um tanto exagerado tanto
e que Deus tenha piedade de mim.
- Você me ama?
- Claro que amo.
- O quanto você me ama?
- Oito quilos e meio.
Se apaixonar pela segunda vez por alguém talvez seja mais raro que amar alguém por toda uma vida, e por isso mesmo, mais fantástico. Quando você olha os mesmos olhos e sente o mesmo cheiro e ri das mesmas coisas de antes e ainda assim, descobre uma nova magia em tudo isso, você se sente mais premiado que da primeira vez.
Apaixonar-se pela primeira vez por alguém é quase um engano. Você está anestesiada por coisas que sempre encantam na primeira conversa, no primeiro café compartilhado, no primeiro beijo. Quando você se apaixona de novo por essa mesma pessoa, tudo é mais honesto. A pessoa deixa de ser um mito e se torna um ser humano com falhas, cáries e bafo matinal.
Quando você se apaixona pela segunda vez pela mesma pessoa, você olha com carinho pra sua celulite. Aceita que nunca vai ter o nariz que desejava. Acorda e se observa, achando graça das próprias olheiras, da bagunça insondável que se tornou o seu cabelo, e também passa a achar isso tudo muito bonito e verdadeiro. É um refil de esperanças, já que todo sentimento é frágil e pode morrer de um dia pro outro, inexplicavelmente.
Mas o encantamento renovado por uma mesma pessoa te faz acreditar que as coisas podem mesmo durar, que a vida pode ser boa e que pelo menos em um momento dela, é muito possível mandar um enorme foda-se para a psicologia evolucionista, Charles Darwin e todos os pesquisadores infelizes de institutos britânicos.
- Eu sei que ninguém passa uma vida inteira sem mudar a personalidade, os hábitos, o corte de cabelo. Acho até muito saudável. Eu não conseguiria admirar alguém que não consegue acompanhar o tempo, ter uma visão sempre fresca das coisas. Mas há uma coisa que eu espero que nunca mude em você. Eu piraria se um dia você se transformasse numa mulher séria, que não vê mais graça em tomar banho de mangueira ou escorregar de meia no chão encerado.
Ela o observa, com um sorriso deslumbrado. Ele sorri de volta e segura sua mão, com uma pergunta ansiosa:
- E você? Existe algo que você jamais aceitaria que eu me tornasse?
- Uma coisa só.
- O quê?
- Um ex.
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