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Eu tinha meu próximo encontro inteiramente planejado. Eu espalharia alguns livros do Bukowski e do Fante no sofá, e em cima da mesa, a filmografia do Wes Anderson. De forma a ambientar um despojamento, não uma bagunça generalizada. E se ele reconhecesse que as coisas estavam dispostas para impressioná-lo de alguma forma, ao menos que ele lembrasse que isso é uma referência woody-alleniana. Ia pegar super bem se ele lembrasse disso.
Eu o deixaria à vontade pra tomar um banho caso ele quisesse. Arranjaria uma toalha azul. Porque azul é de menino. Enquanto ele se divertisse com o coquetel de sabonetes líquidos que eu pré-selecionara para aquela noite, eu escolheria a trilha sonora do nosso “durante”. Música para sexo de primeiro encontro sempre é um assunto delicado. Certa vez um rapaz colocou Sade pra mim. Nada contra Sade, mas como aquilo foi cafa! Certa vez, meu shuffle me traiu e desempenhou um “Fantômas” no meio do nosso desempenho. Mike Patton é o homem mais sexy do mundo, mas dividindo os vocais com Cat Power ou Jenniffer Charles, não com satã.
E é por isso que trilha para sexo é uma arte ainda desvalorizada. Pode catalizar ou arruinar definitivamente o clima. Escolher um tema romântico de cara é pretensioso e canastrão. Deixar à mercê do shuffle do seu iTunes pode ser como abrir a caixa de Pandora. Botar um jazz, apesar de nunca ser errado, pode intimidar demais. Falta a sensação de estar à vontade, a liberdade pra falar uma besteira sem culpa. Afinal, imagina a pressão, fazer sexo com o intelectual apreciador de um gênero musical elegantérrimo quando você, vez ou outra, adora falar de cocô.
E é por isso que eu fiz uma playlist só com canções do Richard Cheese. É um perigoso cruzamento de um jazz refinado com o Tiririca, eu sei. Mas imagina só, que divertido. É a Britney Spears na voz de um fanfarrão, com contrabaixo acústico e metais precisos. É a forma palatável de ouvir a Fergie ou o inusitado Michael Jackson com coro infantil. E ele pode achar que você não é ousada na cama, e você, que ele transpira de uma forma não humana, e vocês descobrem que só há uma camisinha não-lubrificada. Mas quando Richard Cheese se atreve a fazer um mambo de Sunday Bloody Sunday, há essa coisa que nunca pode dar errado. Uma longa e inesperada risada compartilhada, mais instintiva e verdadeira que todos os rituais de reprodução. E com o poder necessário para preencher silêncios constrangedores e roubar a cena no caso de experiências desastrosas.
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